Por que temos que conviver com a inflação?

Publicado em julho/2013

Você trabalha, vende um produto ou serviço e pronto, recebe o pagamento. Antigamente, um maço de notas amassadas, hoje em dia, um PIX, uma alteração do número na tela do seu celular, “parabéns, você acabar de receber dez mil reais”.

Mas o que são reais? São de comer? Já ouvi dizer que ninguém come dólar… Será que comem reais?

O que é dinheiro?

Dinheiro é a representação de um bem ou serviço por meio de moeda ou equivalente (aqueles números no seu internet banking).

Mas você não quer dinheiro, ninguém quer dinheiro. As pessoas querem aquilo pelo qual o dinheiro pode ser trocado, bens e serviços, acesso, influência, conforto, satisfação, etc.

Infelizmente, tem algo acontecendo com o seu dinheiro. A cada ano que passa um real vale menos, um dólar também. As moedas modernas, todas sofrem do fenômeno inflacionário.

Moedas fracas

Em teoria, a moeda deveria existir como representação dos bens e serviços que são produzidos pela sociedade e assim atuar como meio de troca comum entre os diversos agentes econômicos (para não termos que viver de escambo).

Entretanto, com a invenção do dinheiro moderno e a evolução do sistema de crédito, o papel moeda pode ser multiplicado pelos bancos aumentando a oferta de dinheiro. É o chamado sistema de reserva fracionária: O governo estipula que os bancos precisam ter apenas um percentual do total de dinheiro que foi depositado na instituição. Assim, cada real depositado em um banco no Brasil é capaz de gerar empréstimos, aproximadamente, 7,5 vezes maiores que o valor depositado.

A lei da oferta e da demanda é clara. Se há mais oferta para uma mesma demanda, o dinheiro perde valor.

Porque temos uma moeda que perde valor?

Além do sistema de reserva fracionária, possuímos uma moeda sem lastro. Um real vale um real e nada mais, essa é a realidade das moedas nacionais fiduciárias ao redor do mundo (nesse texto exploramos um pouco sobre as suas implicações para o dólar americano).

Nesse sentido, vale mencionar que grande parte do sucesso do Plano Real se deve ao fato da manutenção forçada da paridade entre real e dólar, tendo sido uma forma temporária de dar lastro a nossa moeda.

Moeda forte e inflação

Se a nossa moeda fosse baseada em ouro, ou alguma outra forma de moeda primitiva, o problema da inflação seria parcialmente resolvido.

O estoque de moeda só poderia aumentar conforme o aumento da produção do respectivo lastro.

Então, se a produção global de lastro não fosse maior que a produção global de bens e serviços, haveria menos oferta de moeda e, portanto, não teríamos inflação. Poderíamos até ter deflação.

Por outro lado, uma moeda não expansível poderia ser um entrave para o sistema de crédito, que é um dos grandes impulsionadores das economias modernas, baseadas em consumo.

Dessa forma, voltamos para um dilema bem atual sobre política monetária. O que é pior, inflação ou recessão? Essa é a discussão que os bancos centrais ao redor do mundo enfrentam em um momento de aperto de juros.

Os defensores da inflação

A inflação não é um problema, é uma solução. Uma moeda 100% lastreada, como o dólar do padrão ouro, dificulta a expansão monetária realizada pelos bancos, mas, além disso, reduz os incentivos para se investir.

Se não há inflação, ou pior, se há deflação por que alguém iria correr o risco de investir? Por que alguém iria consumir? Melhor guardar todas as suas cédulas de crédito lastreadas em ouro (ou outro ativo) embaixo do colchão.

Pois é, dinheiro é uma cédula de crédito que você tem contra o Banco Central. Todo dinheiro emitido funciona como uma nota promissória aonde o Banco Central é o devedor, e o portador o credor.

Veja na imagem, a seguir, uma nota de dólar na época do padrão ouro.

A inflação ideal

Um pouco de inflação é bom, porém muito é um problema. Quem sabe a dose? O CMN – Conselho Monetário Nacional definiu nossa meta em 3%, esse é o nosso tanto ideal de inflação, segundo as autoridades monetárias.

Toda a discussão monetária moderna se desenrola sobre o trade off entre nível de atividade econômica e inflação e quais as medidas o Banco Central deve tomar quando a inflação ficar fora de suas metas.

Atividade econômica e inflação

Ainda que o trabalho a partir do qual se originou a curva de Phillips fale sobre nível de emprego e inflação de salários, convencionou-se uma abordagem mais geral sobre o assunto, há um trade off entre nível de emprego e inflação.

Assim, quanto menor o desemprego, maior será a inflação. De tal forma que, a medida em que a inflação se tornar maior que a aceitável pelo CMN, o Banco Central não terá escolha a não ser puxar o freio de mão da atividade econômica.

Quanto maiores os juros, menores os incentivos ao investimento e ao consumo. Um menor nível de investimento e consumo se traduz em uma atividade econômica menor.

Uma economia com menos atividade é uma economia com menos empregos e, de acordo com a curva de Phillips, menor nível de emprego implica em menos inflação. Sim, a solução “moderna” para a inflação é o desemprego.

É claro que as relações entre taxa de desemprego e inflação não são fixas no tempo e mudam de acordo com a produtividade da economia. Mas em termos gerais, “desaquecer a economia” é um eufemismo para demissão em massa.

A inflação de demanda é mais relevante pra curva de Phillips, uma inflação causada por um choque de oferta (como na pandemia), tende a se dissipar sem depender de uma diminuição do nível de emprego.

As implicações de uma moeda fraca para a sua vida

A existência de inflação como um fator estrutural das economias modernas, obriga que os poupadores se tornem melhores investidores. O papel moeda é só um título de renda fixa com rendimento negativo.

Ressalvas

Esse texto não tem a pretensão de cobrir todos os aspectos relacionados a discussão sobre moeda e inflação. Nesse sentido, muitos detalhes foram deixados de lado. Seguimos à disposição caso alguém queira discutir os pontos levantados com maior profundidade.