Offshores como ferramenta para a proteção patrimonial e planejamento tributário

CARACTERÍSTICAS E FUNCIONAMENTO

Acompanhando a demanda crescente por investimentos no exterior, as estruturas constituídas em países distintos ao domicílio de seus associados, denominada “Offshore” ou “Shell Corporations”, têm obtido destaque entre as opções escolhidas pelos investidores brasileiros. Isso porque, a possibilidade de abertura entre fundos exclusivos, trusts ou fundações privadas, a offshore apresenta uma operacionalização marcada pela simplicidade e pouca burocracia, além do fato de que sua estruturação, formada por ações/cotas, já é bastante familiarizada no Brasil. Entretanto, ainda remanescem frequentes dúvidas acerca dessa modalidade de investimento, principalmente no que tange ao funcionamento e à segurança do patrimônio ora alocado.

CONSTITUIÇÃO

Inicialmente, importa esclarecer que para a constituição de uma offshore, o primeiro passo é definir os objetivos do negócio, pois a percepção das necessidades do investidor é importante para a fixação do país em que será constituída, conforme a respectiva legislação e incentivos fiscais. Posteriormente, procede-se à elaboração do “Articles of Association”, que se assemelha ao estatuto social das sociedades brasileiras, e em que serão estabelecidas as atribuições de sócios, administradores e representantes. Por fim, o registro ocorrerá de acordo com a legislação local, concluído após o recebimento, pela sociedade, do certificado comprovando a sua legalidade no país (“Certificate of Incorporation”).

A localidade da offshore geralmente consiste em países onde a tributação é reduzida ou nula, popularmente conhecidos como “paraísos fiscais”, onde são comuns padrões internacionais de regulamentação, de supervisão bancária e financeira, assim como ausência de controle cambial. Conforme a legislação brasileira[1], um paraíso fiscal é aquele país em que (i) a tributação da renda inferior é a 20% (vinte por cento); (ii) prevalece a ausência dessa tributação; ou (iii) veda-se o acesso a informações relativas à composição societária de pessoas jurídicas ou à sua titularidade.[2]

Entre os países dessa categoria, os mais procurados pelos brasileiros são as Ilhas Virgens Britânicas, Ilhas Cayman, Comunidade das Bahamas e Bermudas. Nas Ilhas Virgens Britânicas, por exemplo, não é cobrado nenhum imposto sobre renda, ganhos de capital, herança e doações, existindo apenas a cobrança de uma taxa anual do governo.

Importante ressaltar que, embora constituída em país estrangeiro, as sociedades offshores não são suprimidas de regularização. Acordos e convenções entre países possibilitam o monitoramento das atividades financeiras internacionais, com o intuito de proteger os investimentos e combater condutas ilícitas. Entre elas, destacam-se a OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico); e GAFI (Grupo de Ação Financeira Internacional). No Brasil, o Banco Central do Brasil e a Receita Federal Brasileira são as instituições responsáveis por obter e analisar as informações tangentes aos investimentos realizados pelos brasileiros no exterior.

DECLARAÇÕES NECESSÁRIAS

Nesse contexto, o investidor domiciliado no Brasil tem a obrigação de reportar sua participação societária na offshore, pelo custo de aquisição, por meio da Declaração de Imposto de Renda (DIRPF). Ademais, deve declarar, anualmente, ativos de valor igual ou maior que US$1.000.000,00 (um milhão de dólares) ou equivalente em outras moedas; e, trimestralmente, ativos que de valor igual ou superior que US$100.000.000,00 (cem milhões de dólares) ou equivalente em outras moedas. Essa declaração, por sua vez, ocorre mediante a Declaração de Capitais Brasileiro no exterior (DCBE).[3] A ausência da declaração pode desencadear altas multas, ou até mesmo uma incriminação por sonegação fiscal.

Acerca de aspectos contábeis, não obstante os países caracterizados como paraísos fiscais não exigirem, em regra, registros contábeis complexos, é importante manter a contabilidade da sociedade offshore atualizada.  Assim, o sócio estará preparado, caso a RFB ou o Banco Central solicite a demonstração de valores como patrimônio líquido, total de ativos e passivos, as reservas de lucros, o resultado do exercício, entre outros.

PROTEÇÃO PATRIMONIAL E VANTAGENS DA OFFSHORE

Essa modalidade de investimento oferece, como principal entre os empresários, efetuar operações financeiras na esfera estrangeira, para reduzir ou anular tributos devidos, e, ainda, proteger o patrimônio de riscos vigentes no país. Em outras palavras, a proteção patrimonial visa efetivar maior segurança no que se refere a possíveis penhoras de bens, bem como a crises políticas e econômicas e insegurança jurídica.

Além disso, quem tem interesse pela offshore pretende obter outras vantagens, entre elas: (i) anonimato e privacidade aos investidores; (ii) gestão dos recursos e aplicações financeiras de maneira mais segura; (iii) isenções ou redução na carga tributária; e (iv) taxas de juros mais baixas.

Outra característica marcante da sociedade offshore é a possibilidade de sigilo bancário por meio da ocultação dos dados das transações (como origem e destino do capital, identidade do portador ou o valor), conforme a localidade, tal como ocorre nas Ilhas Cayman.

Não o bastante, o patrimônio alocado nessa hipótese insere-se em um campo protegido contra oscilações cambiais, visto que, depositado em países de moeda forte, estará investido em locais com estabilidade política e econômica.

Do ponto de vista sucessório, a offshore, a depender da localidade de sua constituição, possibilita a transmissão de herança com custos menores ou nulos, diferentemente das burocráticas e demoradas providências relativas a inventário brasileiro.

Similarmente, há flexibilidade societária referente às regras de governança, administração e sucessão, além de poder ser constituída por pessoas físicas ou jurídicas, que podem definir com maior liberdade o regime de suas empresas. As formas societárias mais utilizadas são: sociedade de prestação de serviços, cujos honorários são isentos de tributação; tradings, que importam e exportam produtos com preços mais acessíveis; e holdings, como instrumento de diversificação de capital investido.

CARACTERÍSTICAS TRIBUTÁRIAS

Explorando a perspectiva fiscal, o investimento no exterior via offshore não é objeto de tributação específica na legislação brasileira, permitindo o diferimento do pagamento desses tributos enquanto não são distribuídos. Assim, a tributação ocorrerá quando forem retirados os recursos da sociedade ou quando esta realizar pagamentos de despesas pessoais de seus sócios.

Nesse panorama, a tendência de ascensão das offshores demonstra que veio para ficar, sendo um importante instrumento de proteção patrimonial e planejamento tributário para os empresários brasileiros.

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[1] IN RFB nº 1.037, de 04/07/2010.

[2] A RFB considera, para efeitos fiscais, as seguintes jurisdições como paraísos fiscais: Andorra; Anguilla; Antígua e Barbuda; Aruba; Ilhas Ascensão; Comunidade das Bahamas; Bahrein; Barbados; Belize; Ilhas Bermudas; Brunei;  Campione D’ Italia; Ilhas do Canal (Alderney, Guernsey, Jersey e Sark); Ilhas Cayman; Chipre; Ilhas Cook; Djibouti; Dominica; Emirados Árabes Unidos; Gibraltar; Granada; Hong Kong; Kiribati; Lebuan; Líbano; Libéria;  – Liechtenstein; Macau; Maldivas; Ilha de Man; Ilhas Marshall; Ilhas Maurício; Mônaco; Ilhas Montserrat; Nauru; Ilha Niue; Ilha Norfolk; Panamá; Ilha Pitcairn; Polinésia Francesa; Ilha Queshm; Samoa Americana; Samoa Ocidental;  Ilhas de Santa Helena; Santa Lúcia; Federação de São Cristóvão e Nevis; Ilha de São Pedro e Miguelão; São Vicente e Granadinas; Seychelles; Ilhas Solomon;  Suazilândia;  Sultanato de Omã; Tonga; Tristão da Cunha;  Ilhas Turks e Caicos; Vanuatu; Ilhas Virgens Americanas; Ilhas Virgens Britânicas; Curaçao; São Martinho; e Irlanda.

[3] Em complemento, após 2018, o Banco Central passou a exigir outras informações, como (i) número de empregados; (ii) identificação de eventuais outras controladas indiretas no exterior e de suas atividades, de forma a dar transparência o ativo subjacente investido, fonte primária da renda gerada no exterior (underlying asset); e (iii) se as transações da sociedade são quase exclusivamente com pessoas ou empresas não residentes.