Faz um Bet. Mais sobre apostas, menos sobre investimentos

Publicado em maio/2024

Os brasileiros se familiarizaram com as apostas esportivas e agora também ‘apostam’ com os seus investimentos. Diferentemente de apostas, o investimento pode e deve ser uma forma confiável de acumular patrimônio, além de trazer segurança econômica aos investidores.

Infelizmente, o mercado gosta de vender o que nós gostamos de comprar. E se o brasileiro gosta de apostar por que não vender apostas? Nesse sentido, existem diversos instrumentos financeiros colocados no mercado onde não se defende uma tese de investimentos, mas sim uma estratégia de jogo.

Os retornos acima da média da indústria de Private Equity

Apesar da indústria se encontrar em leve retração, como tudo que tangência o investimento em ativos reais, nessa época de SELIC de 1% ao mês. Os fundos de Private Equity (PE) são um dos veículos de investimento mais defendidos por especialistas.

Um fundo de PE nada mais é que um condomínio fechado no qual os investidores juntam seus recursos para comprar companhias não listadas em bolsa.

Esse tipo de investimento foi disseminado principalmente após o sucesso do Endowment da universidade de Yale, que possuía os investimentos ilíquidos como um dos principais determinantes de seu retorno financeiro, mas isso é história para um texto futuro.

Fato é que, com a popularização desses investimentos e a sua oferta a públicos menos segmentados e mais genéricos, a estratégia hoje é vendida como uma solução para se obter 20% ao ano, observe que é sempre 20% ao ano.

O segredo para se ganhar 20% ao ano? Os assessores de investimento te explicam como funciona: ‘É simples, você investe em 10 empresas em processo de crescimento, algumas quebram, algumas não dão retorno, mas também não dão prejuízo, e uma delas é a grande tacada, o próximo Facebook”. Haja Facebook’s.

Bom, posto dessa forma me parece bastante uma corrida de cavalos (e não é que o mercado usa essa metáfora como algo positivo?): você aposta em 10 cavalos, um deles vai sair vencedor, ‘confia’. Enfim, só para constar, nós não achamos corridas de cavalo um bom investimento.

Veja, temos que fazer as devidas ressalvas, existem bons fundos, boas estratégias, e discursos de venda com maior aderência a realidade.  E talvez a maior crítica seja realmente ao discurso de venda, se o mercado vende a aposta e o investidor a compre, é possível que o gestor passe a fazer apostas. E talvez seja esse o grande problema dessa classe de fundos olhando para o futuro.

Os 3% em bitcoin (ou qualquer outra criptomoeda)

Talvez uma das estratégias de jogo mais irritantes do mercado sejam os 3% investidos em ‘eu não faço ideia do que é isso’.  Ao longo de uma vida de investimentos, é normal que um investidor deixe passar algumas oportunidades.

O problema é que as grandes oportunidades (que deram certo, ninguém comenta sobre as que teriam dado errado) chamam muita atenção e os gestores são cobrados por não ter investido nas pequenas empresas e ativos que performaram muito bem.

Como um gestor pode ser bobo a ponto de não ter comprado bitcoin no final dos anos 2000? E Apple, Amazon e Microsoft após o estouro da bolha.com? O que dizer do gestor que não encheu o carrinho de NVDIA na crise de 2020?

Para tudo o mercado tem uma solução, para não incorrer no risco de omissão, vamos todos comprar 3% do nosso portfólio em coisas que não entendemos de onde vem e não fazemos a mínima ideia de para onde vão. Mas é como um bilhete de loteria, ‘vai que a gente ganha, né?’.

Ficar rico com day trade é uma opção

‘Cruzou a média móvel de 21 períodos de baixa para cima? Em 57% dos casos a compra neste ponto deu retorno positivo, posiciona um stop loss com 50% de retração e um stop gain em 100% de ganho’.

Day trade – uma opção alternativa ao cassino, é tudo estatístico e a banca vai levar o seu dinheiro. Uma forma de se pensar que mais parece uma contagem de cartas em um jogo de 21, e está tudo certo… na mesa do cassino.

O que falar das operações estruturadas – COEs?

O investidor tem medo de volatilidade, então porque não empacotar uma série de ativos voláteis dentro de um ‘certificado’? Em alguns meses, às vezes anos, apuramos a cotação do ativo e pronto, o certificado tem valor ou não.

O investidor não precisa entender o que está dentro do certificado, é só uma parte pequena do patrimônio, só uma ‘pequena aposta assimétrica’.

E para provocar, que tal comprar um terreno no interior? (Quem compra terra não erra/texto aqui)

Desviando um pouco do tema mercado financeiro, que tal falar de ‘investimentos’ enquanto apostas na economia real. Só por pura insistência em defender a nossa forma de investir. 

Esse é para quem gosta de imóveis, então temos um tipo específico de imóvel que, além de não ser fácil de liquidar, incorrer em grandes custos de transação e manutenção, nem ao menos paga aluguel.

Como ganhar dinheiro com esse ativo que não gera fluxo de caixa? É fácil, basta apostar na região, ou no loteamento certo. É só comprar o terreno na próxima cidade que vai ter um boom econômico e fazê-lo antes de alguém mais saber que isso vai acontecer.

Terreno em loteamento? Compre aquele que vai virar bairro de novo rico. Fique longe daquele que se tornará periferia. É simples, basta ‘apostar’ na região certa.

Ressalvas muito importantes de serem lidas

O texto é escrito como uma crítica a determinadas estratégias de investimento que optamos por não executar na carteira de nossos clientes. Apesar de tudo que foi exposto, há espaço no mercado para os diversos tipos de investidores, inclusive os apostadores.

Existem bons apostadores e, por vezes, eles podem jogar e serem vencedores. A problemática é que nós não participamos de teses cujo argumento fundamental é semelhante a uma proposição de jogo de azar

A nossa forma de mitigar o papel da aleatoriedade na execução do investimento é manter o foco em coisas palpáveis e comprar teses que dependam da distribuição do fluxo de caixa de uma atividade da economia real para os seus stakeholders.

Como exposto anteriormente, para algumas das teses mencionadas o problema não é o investimento ou a aposta em si, mas proposta de venda apresentada ao investidor. O processo de investir começa no conceito de investimento.