Contra intuitivamente ao comportamento dos mercados, os últimos dados de setembro sobre a situação fiscal do Brasil têm apresentado resultados bem melhores que os esperados:
Resultado primário (sem contar com os juros da dívida): No acumulado até setembro, os entes subnacionais (estados e municípios) obtiveram um superávit de +1,45% do PIB (R$ 92 bilhões) – o melhor resultado em 30 anos.
Já o governo central, que inclui o Governo Federal e o INSS, apresentou um déficit de -1,29% do PIB (R$ 82 bilhões), próximo ao patamar de 2019 de -1,2% do PIB, mesmo com gastos adicionais com a COVID em 2021.Somando o superávit fiscal dos estados e municípios com o déficit do governo central temos um surpreendente superávit de R$ 14 bilhões (+0,22% do PIB).
Vale lembrar que em 2020, por causa dos custos da pandemia, o déficit primário chegou a estratosféricos -9,5% do PIB. Os números de 2021 indicam que o Brasil voltou rapidamente para a situação fiscal anterior à COVID.
Para se ter uma melhor ideia da melhora, o resultado primário do governo central esperado para 2021, déficit de R$ 139,4 bilhões, é 44% menor do que a meta estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021, que previa um déficit de R$ 247,1 bilhões. A melhoria do cenário fiscal é resultado do forte aumento de arrecadação do governo central, consequência da recuperação da atividade econômica e da inflação.
Resultado nominal (que inclui a conta de juros): É o resultado que importa para observamos a dinâmica da dívida pública. Com a melhora no resultado primário descrito acima, o déficit nominal de -16,32% do PIB até setembro de 2020 caiu para -4,37% do PIB neste ano, também no acumulado de 9 meses. E a expectativa é terminar o ano com um déficit nominal de 6% do PIB, ou seja, no mesmo valor de 2019 e bastante inferior aos 13,63% do ano passado.
Com relação à dívida pública, cujas previsões em 2020 indicavam que poderia atingir a relação de 100% do PIB em 2021, deve fechar o ano em 83%. Assim, em relação ao exercício de 2021, o quadro fiscal que havia iniciado o ano cheio de incertezas está relativamente tranquilo.
Com a melhora do quadro fiscal, portanto, por que os preços dos ativos brasileiros estão sofrendo tanto?
Podemos considerar que, isoladamente, as mudanças no teto de gastos e a expansão das despesas para 2022 em mais 92 bilhões*, em um cenário de inflação elevada, não piorará de forma significativa o resultado primário e a trajetória da relação dívida/PIB no ano que vem.
O grande problema aqui é a crescente incerteza sobre as ações do governo no ano eleitoral e a eventual transformação de temporários para permanentes os gastos públicos fora do teto. O aumento permanente da despesa, prejudica as contas públicas menos pela piora do resultado primário (sem juros) e mais pelo aumento das taxas de juros, o que elevaria significativamente o custo da dívida pública. Também pesa bastante a incerteza sobre compromisso do próximo governo com o rigor fiscal.
Infelizmente, a desancoragem das expectativas e a falta de bússola sobre os resultados fiscais em 2022 têm conseguido transformar um cenário de recuperação fiscal em um cenário de maior risco.
* Teria a seguinte destinação: Auxílio Brasil: R$ 50 bilhões; atualizações de benefícios previdenciários: R$ 24 bilhões; despesas obrigatórias vinculadas ao teto (saúde e educação): R$ 6 bilhões; outros poderes: R$ 2 bilhões e outras Despesas: R$ 9,6 bilhões (tais como emendas parlamentares, bolsa diesel e auxílio gás, por exemplo).