No Brasil, até um passado recente, a poupança da maior parte dos investidores estava aplicada em títulos de renda-fixa atrelados ao juro de curto-prazo, o famoso x% do CDI. A queda estrutural das taxas de juros, a partir de 2016, mudou este cenário e os brasileiros tiveram que buscar alternativas para manter seus rendimentos, principalmente nos mercados de renda variável.
Durante esse período de redução das taxas de juros, convivemos com taxas de juros reais negativas, em outras, palavras taxas nominais menores que a inflação em 2020 e ao longo de todo o ano de 2021, conforme demonstrado na tabela abaixo.
Fonte: IPA
Importante destacar que as taxas reais de juros das principais economias desenvolvidas, como os Estados Unidos o Japão e a Europa, estão no campo negativo também há algum tempo.
Entretanto, com o aumento da pressão inflacionária a partir dos desdobramentos da crise da Covid-19, no início de 2021, as autoridades monetárias do Brasil começaram o processo de subida dos juros básicos que se elevaram de 2% para os atuais 5,25%, com expectativa de fechar o ano entre 7,5% e 8% ao ano, segundo as previsões do Relatório Focus do Banco Central. Neste momento é importante fazer a diferenciação dos juros de curto prazo dos juros de longo prazo:
O juros curto, muito mais repertoriado pela mídia e conhecido do grande público, é representado pela Taxa Selic Meta – que é a taxa básica de juros da economia e é definida como meta pelo Banco Central, através do Comitê de Política Monetária (Copom). O Banco Central, por meio de instrumentos de política monetária, age para fazer com que a Taxa Selic Efetiva convirja para a Taxa Selic Meta definida e a Taxa do CDI – taxa de juros de 1 dia dos empréstimos interbancários, ou sejam, quando um banco empresta a outro sem oferecer garantias em contrapartida. A Selic Meta, Selic Efetiva e CDI costumam apresentar taxas muito próximas entre si.
Bem menos conhecidos, ou compreendidos em geral pelo público são os juros longos, utilizados para as operações de maior duração. O principal fator que influencia as taxas de juros é o prazo. Em situações mais normais, quanto maior o prazo, maior o juros exigido pelos emprestadores de recursos.
As expectativas macroeconômicas em geral, sobre a inflação em particular e sobre a política monetária a ser seguida pelo Copom também são determinantes para o patamar dos juros de longo-prazo. A avaliação sobre os riscos políticos e econômicos também afeta diretamente o comportamento dos juros futuros.
A estrutura a termo dos juros é conhecida como curva de juros, representando o custo do dinheiro em relação ao tempo.
Apesar dos juros básicos (Selic meta) estarem em 5,25%, os juros longos já se encontram em patamares muito mais elevados nesse momento, refletindo expectativas pessimistas em relação à inflação e o aumento dos riscos políticos e econômicos.
No gráfico abaixo apresentamos a curva de juros do início do ano comparada com a do final de agosto. Pode-se verificar o seu deslocamento pra cima, significando o aumento expressivo das taxas ao longo de toda a curva. Outra mudança significativa é que, ao final de agosto, a curva sobe muito mais rapidamente no início já atingindo patamares de juros superiores a 9% no início 2024 e depois eleva-se mais discretamente até 2031, chegando a 10,37%, indicando a expectativa de juros mais altos no curto prazo.
Fonte: IPA
O que o aumento das taxas de juros significa para os seus investimentos?
Como abordamos em oportunidade anterior (clique aqui), normalmente o que determina a atratividade de um investimento é o seu custo de oportunidade.
Portanto, à medida que os juros de curto prazo sobem, o investidor deve cobrar mais caro para assumir investimentos de risco. Seja esse risco materializado por um prazo maior, um indexador menos favorável ou até mesmo a renda variável.
Por exemplo, um título pré-fixado de 10 anos do tesouro direto está oferecendo uma taxa de 11% ao ano, enquanto o título pós-fixado rende o CDI que se encontra em 5,15% um prêmio de 5,85% (ou um retorno 2 vezes maior) em relação à taxa de curto prazo.
À primeira vista o investimento parece muito atrativo, porém, durante um ciclo de alta de juros, se as expectativas econômicas se deterioram como temos no momento, o mercado passa a cobrar um prêmio cada vez maior para emprestar dinheiro a longo prazo, sendo assim, um título que aparenta ter um bom retorno pode acabar entregando um retorno negativo no curto prazo.
No início de 2021, o mesmo título pré-fixado de 10 anos pagava 6,84% ao ano contra um CDI de 1,90%, um prêmio de 4,94% (ou um retorno 3,6 vezes maior). A medida em que o ano passou e as expectativas econômicas deterioraram chegamos ao cenário atual de 11%. Assim, o investidor que comprou esse em 04/01/2021 amargou perdas de 5,24% desde a sua aquisição, até 31/08/2021, por outro lado, o investidor que carregou o pós-fixado está com retorno positivo de aproximadamente 2% no mesmo período.
O retorno negativo acontece, pois, como explicamos em texto anterior (clique aqui), o que é fixo na renda fixa é a fluxo de caixa (o cupom), ou seja, o preço dos títulos variam de acordo com as taxas de mercado. A queda aconteceu com os títulos públicos indexados (IPCA+), com o índice de fundos imobiliários (IFIX), e com o Ibovespa. Todos os ativos (ou índices de ativos) brasileiros ajustaram seus preços para baixo, conforme o cenário macroeconômico foi piorando.
Fonte: IPA
Aplique em renda fixa
À medida que os preços dos ativos caem, principalmente os de renda fixa, as suas taxas de retornos esperadas aumentam. No momento, o retorno do título pré-fixado de 11% ao ano, é superior à variação média do IPCA, IGP-M e até mesmo ao retorno médio do Ibovespa desde o ano 2000.
Fonte: IPA
Os papeis indexados à inflação, por sua vez, estão oferecendo retornos reais (IPCA +) muito próximos aos 5% ao ano. Se considerarmos que a inflação a longo prazo vá convergir para a meta de 3% ao ano a partir de 2023, estamos falando de retornos nominais na casa dos 8% ao ano. Ou, se considerarmos inflação embutida na curva de juros de aproximadamente 6%, estamos falando de retornos nominais na casa dos 11% ao ano (o retorno do título pré-fixado).
É inegável que o atual patamar da renda fixa sugere o aumento da alocação a essa classe de ativos.
Invista em empresas
É importante fazer a ressalva de que os ativos de renda variável também tiveram suas cotações fortemente impactadas pelos eventos recentes, dessa maneira, ainda que possamos aplicar os conceitos de custo de oportunidade e prêmio de risco como uma regra geral, é importante ser seletivo na troca de seus ativos, para não vender ações em patamares mais baratos do que se deve.
Com as recentes desvalorizações existem bons ativos em bolsa que acreditamos que entregarão retornos reais e nominais acima das taxas apresentadas pelo tesouro. É sempre bom lembrar que não compramos o Ibovespa, fazemos uma seleção criteriosa de ativos (stockpicking).
Como abordado no texto anterior, uma boa carteira de investimentos deve considerar o equilíbrio entre a renda fixa e a variável, de acordo com o perfil do investidor.
Estados Unidos
A questão do nível das taxas de juros também tem dominado o mercado americano ao longo dos últimos meses. Nos Estados Unidos, com as taxas básicas zeradas desde 2020 e o programa de compra de ativos do FED, o nível de eventual elevação das taxas de juros e, principalmente, quando ela se dará tem dominado a preocupação dos mercados.
Nos Estados Unidos, a taxa básica de juros de curto prazo é definida pelo FOMC (Federal Open MarketCommittee) e está desde 2020 na faixa estacionada na faixa de 0,00% a 0,25%, implicando em juros reais negativos.
Os juros de longo prazo representados principalmente pelos títulos de 10 anos do Tesouro Americanos, as TreasuryNotesde 10 anos. Encontra-se hoje em cerca de 1,3% ao ano. Com dados abaixo do esperado sobre a economia, como a geração de empregos bastante inferior ao esperado por exemplo, têm trazido certo alívio ao mercado ao postergar o inevitável aumento das taxas de juros.
A elevação dos juros nos Estados Unidos, que em algum momento inevitavelmente virá, impacta também as taxas e preços dos ativos no Brasil, na medida em que pressiona por juros maiores em todo o globo.