No dia 08 de junho, as ações preferenciais da Petrobrás atingiram a cotação de R$ 28,66, uma grande recuperação em relação aos preços do dia 22 de fevereiro (R$21,67), quando as ações e desvalorizaram 26,7% em apenas dois dias na esteira da comunicação da troca do Presidente da Companhia e do temor de interferência na política de preços dos combustíveis.
No texto abaixo, analisamos a empresa e se com as cotações, nos patamares atuais, representa uma boa oportunidade investimento, considerando os seus diferenciais competitivos, mas também as ameaças envolvidas.
Quem é a Petrobrás?
A Petrobras é uma das maiores petroleiras do mundo, atuando nos setores de exploração e produção (E&P), refino, transporte, comercialização e geração de energia. Apesar de atuar em várias etapas do negócio de combustíveis fósseis, sua receita vem majoritariamente dos segmentos de refino e E&P. No total os 2 segmentos representam 91% das receitas.
Gráfico 1: Divisão de receitas
Fonte: I.P.A.
Além disso, nos últimos anos, a Petrobrás vem fazendo desinvestimentos de atividades não core e pouco rentáveis, em parte por uma questão de eficiência, mas também por conta de acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) para diminuir a sua participação no mercado de refino brasileiro, de 98% em 2015, devendo chegar a menos de 50% até 2025.
A médio prazo, a atividade de exploração e produção deve se tornar a principal fonte de receitas da companhia. Isso faz sentido para a empresa, pois é a parte mais rentável do negócio, como pode-se ver no gráfico a seguir. Apesar de contribuir apenas com 38% da receita, é responsável por 85% do EBITDA (uma proxy para a geração de caixa) da companhia.
Gráfico 2: Divisão de EBITDA
Fonte: I.P.A.
Essa grande discrepância entre as receitas e a geração de resultados decorre principalmente da margem de cada uma das áreas de negócio. No gráfico 3, é possível observar a margem EBITDA de E&P próxima a 70%, enquanto a do setor de refino, nos seus melhores momentos, se aproxima de 10%.
Gráfico 3: Margens por segmento
Fonte: I.P.A.
Outra circunstância que pode ser visualizada nos gráficos 3 e 4, é a constante melhora nas margens da empresa como um todo, fruto da mudança de gestão e planejamento estratégico realizados nos últimos anos. Ao se desfazer de ativos menos rentáveis e investir nos mais rentáveis, a companhia vem melhorando consistentemente sua margem EBITDA e líquida.
Gráfico 4: Margens ano a ano
Fonte: I.P.A.
Faz-se um parêntese aqui para o ano de 2020. Durante a pandemia da COVID-19, a queda da mobilidade e do consumo de combustíveis que fez com que a receita caísse consideravelmente, levando a uma menor alavancagem operacional. Ainda assim, a companhia alcançou uma margem EBITDA superior à de 2018 e uma margem bruta recorde devido à queda do custo de extração, que alcançou incríveis 5,2 dólares por barril equivalente.
Dívida e (des)investimentos
Tendo em vista a estratégia de se desfazer dos ativos não core e focar naqueles de maior rentabilidade, a Petrobrás vem realizando a venda de poços em terra, águas rasas, águas profundas e pós-sal. Realizará novos investimentos e perfurações majoritariamente no pré-sal, onde o custo de extração chega a ser mais de 3 vezes menor do que em terra (4 dólares por barril, contra 15 em terra).
Nos próximos 5 anos a companhia pretende investir 55 bilhões de dólares, sendo 84% destinado a atividade de E&P. Além disso, estima-se que arrecadará 3,4 bilhões de dólares com a venda de refinarias.
Gráfico 5: CAPEX
Fonte: Petrobrás RI
Ainda sobre a alocação de capital, desde 2016 a dívida líquida da companhia caiu de 96 para 66 bilhões de dólares, uma redução de 30 bilhões. Essa redução não melhora apenas os indicadores operacionais da empresa como, por exemplo, a relação dívida líquida/EBITDA que se encontra em 2,33x (3,76x em 2016), mas contribui também com a melhoria da margem líquida por meio da redução das despesas de juros.
Gráfico 6: Endividamento
Fonte: Petrobrás RI
Outra questão importante que compreende o endividamento é a política de remuneração aos acionistas. De acordo com essa política, no momento em que a dívida bruta ficar abaixo de 60 bilhões de dólares a empresa passará a distribuir aos acionistas 60% do fluxo de caixa livre (FCL), em substituição do critério atual de 25% do lucro líquido.
Para se ter uma ideia do impacto dessa mudança, em 2019 o lucro líquido foi U$ 10,4 bilhões, portanto, poderiam ter sido distribuídos 25% em proventos, o equivalente a um DY (Dividend yield) de 2,6%. Caso a política de distribuição fosse sobre o FCL, U$ 20,5 bilhões, teriam sido distribuídos 60% em proventos, o equivalente a um Yield de 12,2%.
O FCL projetado para 2021 é de U$ 19,5 bilhões, ou seja, se a dívida bruta estiver abaixo de U$ 60 bilhões no final do ano, podemos esperar um DY, sobre o custo, de 15,5% para quem comprar nos preços atuais, a ser pago no ano de 2022.
A empresa vem melhorando suas margens, vendendo seus ativos de menor interesse, reduzindo sua dívida e investindo em campos de petróleo mais rentáveis. Todas essas são ótimas notícias, porém, é importante considerar algumas perspectivas de longo prazo antes de partimos para o processo de valuation.
A mudança da matriz energética e as petroleiras
O recente desenvolvimento das fontes de energia limpas trazem uma preocupação a mais para o setor de óleo e gás. Está em curso uma transição global para fontes energéticas renováveis e de baixo impacto ambiental, duas características que não se associam ao petróleo. Tanto na bolsa brasileira quanto na americana, as empresas associadas à matriz energética “suja” não apresentaram boa performance nos últimos anos.
Um dos aspectos muito debatidos pelos investidores é o da emergência dos veículos elétricos, protagonistas na bolsa americana durante o ano de 2020 – Tesla (principal fabricante de veículos elétricos da nova geração) se apreciou em mais de 700% no período e entrou para o principal índice de ações do país, S&P500. Por enquanto, apesar da sua crescente adoção nos países desenvolvidos, que deve se acelerar nos próximos anos, a geração da energia que os alimenta vem primariamente de fontes não renováveis.
Gráfico 7: Matriz global
Fonte: Empresa de Pesquisa Energética (EPE), 2018
Outro aspecto de grande relevância para os investidores, diz respeito à intermitência e ao armazenamento da geração de energia renovável. As principais fontes associadas à nova matriz energética (limpa), são a eólica e a solar. O grande problema de ambas é a sua alta dependência de situações específicas para a geração de energia. A eólica depende da força dos ventos e a solar do nível de insolação, variáveis naturais dependentes da região e do horário.
As principais fontes renováveis são, portanto, intermitentes. O sistema, entretanto, consome energia o tempo inteiro. A demanda não deixa de existir porque está ventando pouco ou está mais nublado. Duas situações em 2021 demostraram o problema da intermitência: No Texas, turbinas eólicas congelaram devido ao intenso frio. No Brasil o baixo nível atual dos reservatórios hídricos só não nos deixou em situação de racionamento devido ao crescimento da nossa capacidade de geração de energia térmica nos últimos anos.
Em consequência, torna-se importante haver back up para equalizar a oferta e a demanda durante períodos desfavoráveis às fontes renováveis. É quando as geradoras de energia térmica entram em ação. Assim, mesmo com o aumento da participação da matriz limpa na geração de energia, o gás, o petróleo e seus derivados são ainda a principal forma de se estocar energia.
Importante ainda lembrar que grande parte dos matérias que utilizamos, como os plásticos, ceras, asfalto e borrachas, são derivados do petróleo.
Governança corporativa
Desde a sua criação em 1953, em várias ocasiões, a Petrobrás foi utilizada pelo controlador para fins políticos em detrimento dos interesses dos demais acionistas. Cumpre destacar o controle artificial de preços para segurar a inflação, utilizado muitas vezes ao longo da sua história, com destaque para a primeira metade da década de 2010, e a política de investimentos nos mais variados setores, sem muito foco e compromisso com retorno, que causaram grandes prejuízos à empresa.
Depois dos desdobramentos do chamado Petrolão, mudanças foram feitas na governança corporativa para se tentar evitar, ou minimizar, as interferências políticas na Companhia. Entretanto, é importante ter sempre em perspectiva que os riscos relacionados ao seu controlador estarão sempre presentes na tese de investimento em Petrobrás
O grupo de controle, formado pelo Governo Federal, BNDESPAR e BNDES, detém somente 36,75% do capital total da empresa. Em outras palavras, ao longo do tempo, a maior parte do investimento na empresa foi feito por entes privados (63,25%) e não pelo Estado. Ainda assim, com 50,5% do capital votante, o Governo Federal mantém o controle da empresa, indicando 7 dos 10 membros do Conselho de Administração.
Quanto vale a Petrobrás? (valuation)
Após fazermos uma análise descritiva da empresa e de sua situação, vamos partir para análise quantitativa. Hoje a Petrobrás está cotada a mercado no valor de U$ 75,1 bilhões de dólares. Para chegar em um valor justo da empresa, vamos utilizar o que foi exposto anteriormente com as seguintes premissas:
- Produção de óleo e gás estável em 2,7 mi/ boe;
- A cotação do petróleo parte dos atuais 70 dólares por barril até chegar a um patamar de 60 dólares no longo prazo;
- As receitas caem em uma média de 3% a.a. devido aos desinvestimentos e redução do preço do barril;
- Com os ganhos de eficiência e foco nos poços mais rentáveis, a margem de lucro antes dos juros e impostos será de 36%;
- O CAPEX de 55 bilhões será realizado até 2025, após esse período os investimentos serão iguais a depreciação, portanto, não haverá crescimento de longo prazo acima da inflação.
Com base nessas premissas e utilizando um modelo de fluxo caixa descontado, com taxa de desconto de 11%, chegamos a um valor justo de R$41,63 por ação.
Realizando um comparativo por múltiplos, para a Petrobrás negociar na mesma relação EV/EBITDA média de seus pares internacionais, o valor justo seria de R$44,86 por ação.
Por fim aos preços atuais estimamos uma TIR real de 13% (IPCA + 13%) ao ano para quem comprar ações de Petrobrás hoje.
Ressalvas
Nossa analise de Petrobrás é feita com base em balanços e resultados em dólar, portanto, as variações cambiais podem afetar o valor justo do ativo em reais, você pode ler um pouco mais sobre as nossas perspectivas para o dólar clicando aqui.
Todo valuation é baseado em premissas e expectativas, sendo assim, o valor justo pode e deve ser reavaliado a medida que a realidade se apresenta.
Como abordado, a Petrobrás é uma empresa de capital misto, cujo o controlador é o governo federal. Qualquer intervenção efetiva que possa afetar os resultados deve impactar materialmente o valor justo.